O Brasil se destaca no cenário mundial, como um grande exportador de carne e há tempos a agropecuária se consolidou como um pilar da economia do país, gerando uma receita de bilhões de reais e gerando empregos diretos e indiretos.
Mas, quando falamos dessa indústria, também estamos falando de um marketing muito eficiente, que faz um trabalho intenso para manipular a percepção das pessoas sobre o que é a agropecuária.
Assim, muitos aspectos envolvidos na produção de carne não chegam ao público.
As políticas agrícolas moldadas para mover a indústria da carne, inventiva a destruição ambiental, as desigualdades sociais e agravam as crises climáticas.
A pecuária recebe subsídios bilionários, sem falar nos benefícios fiscais, e o impacto disso vai muito além da nossa fronteira, alcança o oceano, ecossistemas diversos e comunidades ao redor do mundo.
Benefícios Fiscais e Subsídios
A agropecuária recebe em torno de R$12 bilhões, anualmente,em forma de subsídio para o setor, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU). Esse dinheiro é usado para expandir as áreas de pastagens e adquirir novas tecnologias.
Esses incentivos são fornecidos sob a justificativa de que a agropecuária é uma atividade essencial para a economia, mas os dados vêm trazendo um cenário preocupante.
A plataforma MapBiomas, por exemplo, aponta que mais de 90% do desmatamento registrado na Amazônia está relacionado com a pecuária. As áreas de floresta nativa são, normalmente, transformadas em pastagens para os animais ou em monoculturas de soja para alimentar esses animais.
Além disso, existem os incentivos fiscais que agravam a situação como um todo, como a lei kandir. Ao isentar os produtos agrícolas que são destinados para a exportação, essa lei leva a um déficit, significativo, na arrecadação anual de impostos.
Para ilustrar melhor, calcula-se que mais de 100 bilhões deixaram de ser recolhidos. Esse recolhimento poderia, inclusive, ter sido direcionado para estimular as práticas agrícolas mais sustentáveis e para a proteção de ecossistemas críticos, que já são tão prejudicados por atividades como a pecuária intensiva.
Ecossistemas marinhos: outra parte afetada pela indústria da carne
É muito mais comum ouvirmos falar sobre a relação entre a pecuária e o desmatamento do que sobre os impactos dessa indústria nos ecossistemas marinhos. Mas eles existem, e são muito preocupantes.
O desmatamento, que já sabemos que acontece, tem alguns desdobramentos que não são tão discutidos.
Quando áreas são desmatadas para pastagem, ou plantar soja, gera erosão do solo, que transporta sedimentos ricos em nutrientes para os rios e, eventualmente, para o mar. Isso leva a um fenômeno que é conhecido como eutrofização.
A eutrofização é justamente esse acúmulo excessivo de nutrientes.
Esse processo induz o crescimento descontrolado de algas e plantas aquáticas, que ao se decomporem consomem o oxigênio da água.
Isso cria o que é chamado de “zonas mortas”, onde a vida marinha não consegue sobreviver.
Hoje existem cerca de 700 zonas que já foram identificadas ao redor do mundo, incluindo áreas da costa brasileira.
As consequências disso são graves.
A destruição de habitats marinhos afeta diretamente comunidades que dependem da pesca para subsistência.
Hoje, no Brasil, 70% da base alimentar vem da pesca familiar. Logo, essas zonas mortas, e consequente redução da população de peixes, significa perda de renda dessas comunidades e insegurança alimentar. Isso é um impacto que vai além do oceano e das vidas marinhas.
O preço que a humanidade paga
Os impactos são enormes e não param por aí.
A pecuária é tida como uma das principais atividades que emitem gases de efeito estufa e contribui de maneira significativa para as mudanças climáticas.
Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), 14,5% das emissões globais são provenientes da pecuária.
Além disso, o gasto de água doce é outro ponto importante de preocupação.
Para produzir 1kg de carne bovina, são necessários 15.400 litros de água. Isso em um país onde milhões de pessoas vivem em condições precárias com problemas de abastecimento de água.
Esse modelo de produção é, no mínimo, insustentável.
As principais consequências da pecuária, e quem paga diretamente o preço, são as comunidades rurais, indígenas e trabalhadores do campo. Isso inclui perda de terras, conflitos agrários e contaminação dos recursos hídricos.
O que pode ser feito?
Com todo esse cenário, a pergunta que fica é: como podemos reverter tudo isso?
Essa resposta precisa de uma combinação de mudanças políticas, econômicas e sociais.
Primeiro, é essencial redirecionar os subsídios que hoje alimentam essas práticas prejudiciais.
Em vez de financiar a expansão da pecuária, os recursos precisam ser destinados para a promoção de práticas agrícolas regenerativas, como a agroecologia e os sistemas agroflorestais, que unem produção e preservação ambiental.
Segundo, é urgente reforçar a fiscalização e criar incentivos para a recuperação de áreas degradadas.
O uso de tecnologias, como o monitoramento por satélites, podem ajudar a identificar práticas ilegais e reforçar essa fiscalização, e políticas que premiem a sustentabilidade podem ser criadas para estimular as mudanças que são necessárias nesse setor.
Não menos importante, a conscientização das pessoas é algo indispensável.
Nós, enquanto consumidores, temos o poder de influenciar o mercado ao escolher produtos mais sustentáveis e isso gera uma pressão nos governos e empresas por mais responsabilidade.
Conclusão
O impacto das políticas agrícolas na produção de carne transcende os limites das fazendas e dos mercados globais.
Ele está profundamente ligado com a saúde do planeta, a segurança alimentar de bilhões de pessoas e a sobrevivência de ecossistemas inteiros.
Para lidar com essa realidade é preciso coragem e, também, ação. É preciso questionar os modelos econômicos que colocam o lucro de poucos acima do bem-estar de muitos.
Além disso, a sustentabilidade precisa estar no centro das decisões políticas e econômicas.
As consequências da falta de ação são latas demais para serem ignoradas.
Como sociedade, precisamos decidir: continuaremos subsidiando a destruição, ou investiremos na construção de um futuro mais equilibrado e justo?
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